O Artigo aqui não pretende ser uma visão definitiva sobre os rumos da profissão do Quadrinista no mercado atual dos quadrinhos e nem um estudo pormenorizado sobre o tema, mas abordar um aspecto importante deste ofício: "Qual afinal é o papel do profissional de Histórias em Quadrinhos?", qual sua posição diante deste Mercado?
Scott McCloud em "Desvendando os Quadrinhos" pág 172
Acredito que esta reflexão valha muito a pena sobretudo para um mercado de quadrinhos como o brasileiro que apenas nos últimos anos tem dado uma guinada rumo ao profissionalismo e reconhecimento merecidos, a ideia para esta reflexão me veio ao reler um trecho do livro de Scott McCLoud " Desvendando os Quadrinhos" ( mais exatamente as páginas de 172 a 178 ), onde acredito que o autor tenha feito sua principal contribuição para a carreira de quem quer se aventurar a esta profissão, e uma importante uma pergunta é lançada:
- Ser quadrinista é apenas conseguir se engajar, fazer parte de uma indústria deste entretenimento? Ou o artista é mais que um membro de uma linha fria de produção e é possível ver seu ofício como a verdadeira forma de arte que é?
Com o advento da internet e a disseminação do conhecimento e técnicas, a maior preocupação dos aspirantes à indústria dos quadrinhos é conseguir "atalhos", todos querem o segredo ou a facilidade para se inserir em um grupo, uma editora, como se um caminho "fácil" fosse possível e mesmo que o caminho seja, digamos, mais acessível para se tornar um profissional, o principal entrave infelizmente ainda não faz parte do cartel de prioridades e da mentalidade da maioria dos artistas: - "Fazer a diferença".
Como editor há mais de 10 anos nesta função e como artista no ramo de quadrinhos já estive em centenas de mostras e convenções observando e analisando milhares de páginas de quadrinhos e portfólios, em 95% dos casos as pessoas buscam um forma de se engajar nesta indústria de qualquer jeito, e uma minoria busca a pergunta de ouro: -" Como posso fazer a diferença"? Isso se reflete impiedosamente na quantidade incrível de trabalhos com erros que o próprio artista não vê, e quando não (e infelizmente é uma quantidade enorme) são trabalhos copiados em que o artista acha que o avaliador não irá perceber sua trapaça, infelizmente em certos segmentos de mercado copiar e clonar o estilo de um artista famoso é estranhamente tido como necessário devido à "demanda" de mercado. O desespero de adequar seu trabalho ao "traço do momento" vai na contramão de sua evolução como artista e na maioria dos casos também na contramão do que realmente buscam os avaliadores.
Claro que num país como o Brasil onde as Artes são vistas como preocupação menor em nossa cultura conseguir uma vaga a qualquer custo ainda prevalece na mente dos jovens que, inseridos em um estúdio parecem não se preocupar em ficar à sombra de um artista maior por toda uma carreira; essa é uma realidade triste e que não deve ser encorajada, infortúnio e reflexo de uma sociedade onde por falta de oportunidades muitas pessoas com talento parecem se bastar no simples fato de conseguir uma ocupação nesse ramo e nunca desenvolverem seus reais talentos.
Por outro lado felizmente, isso tem mudado visto o número de artistas talentosos que se lançam a publicar material fora do "mainstream" em serviços como Catarse, mostrando uma preocupação genuína no desenvolvimento dos quadrinhos como forma de arte e sua evolução como artista, sem as algemas editorias muitos conseguem dar vazão à uma criatividade sem limites.
Editoras menores e mais próximas dos artistas, conseguem fazer edições menores e atender a uma fatia de mercado que busca este material diferenciado, tiragens gigantes não são mais uma realidade do mercado de quadrinhos seja aqui ou no exterior.
Scott McCloud em "Desvendando os Quadrinhos" pág 176
Os artistas que se destacaram e são lembrados como pioneiros foram justamente aqueles que buscaram o "algo além" e construíram uma identidade, quebrando paradigmas: Alan Moore, Frank Miller, John Mark DeMatteis, Bill Sienkiewicz, Jim Steranko, Will Eisner, Bill Watterson, Liniers, Neil Gaiman, Grant Morrison, Kazuo Koike e Goseki Kojima, Daniel Clowes, são exemplos de alguns artistas que mostraram que mesmo dentro de um contexto mais comercial e que necessitava agradar o público conseguiram imprimir uma nova linguagem e um estilo próprios.
Elektra de Bill Sienkiewicz
Spirit de Will Eisner
A fabulosa e pioneira arte de Jim Steranko
Indo mais além na busca desta identidade, são artistas que foram ainda mais longe em sua pesquisa e inovação por uma identidade própria e ainda assim conseguiram atender às demandas de mercado, mostrando que é possível conciliar arte e profissão, identidade e acessibilidade, como Caza, Phillipe Druillet, Moebius,
No Brasil temos alguns artistas que com certeza quebraram as barreiras do senso comum e com certeza fosse este um país sério estariam gozando do reconhecimento e prestígio devidos, artistas como o impressionante Antonio Amaral e todos os artistas do movimento os Quadrinhos Poético-Filosóficos , Lourenço Mutarelli, Danilo Beyruth, Jaca, Marcatti, Calazans, Laudo Ferreira
O impressionante Antonio Amaral e sua mescla de pintura, hq e poesia!
Desgraçados de Lourenço Mutarelli um dos mais impressionantes Quadrinhos Brasileiros já publicados.
Detalhe de página do italiano Andre pacienza (R.I.P) um artista que fazia cada HQ sua em um estilo de traço diferente!
Pensar que o conteúdo proporcionado pelos quadrinhos deve estar atrelado às demandas imediatistas e visão pobre de conteúdo da indústria do entretenimento é um fator limitante e muito triste para o potencial de arte que os quadrinhos e seus artistas têm a oferecer. Scott McCloud nos mostrou que até mesmo na indústria do entretenimento, há um "Tao" possível.
por: Ed Oliver ( Portal dos Quadrinhos)
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